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"Aprende-se a escrever, lendo. E também é necessária uma grande humildade face ao material da escrita. É a mão que escreve. A nossa mão é mais inteligente do que nós. Não é o autor que tem de ser inteligente, é a obra. O autor não escreve tão bem quanto os livros."
António Lobo Antunes

Friday, 6 February 2009

Poderia (mil e uma vezes)

Poderia iniciar este texto de mil e uma maneiras, mas nenhuma delas seria brilhante, poderia descrever mil e uma maneiras de escrever uma musica, mas nenhuma delas seria original, poderia escrever mil e uma coisas que nenhuma seria verdadeira, poderia deparar-me com mil e uma questões e não iria saber responder a nenhuma, poderia ser salva mil e uma vezes que cairia no fundo novamente, poderia pensar mil e uma coisas mas nenhuma faria parte da minha realidade, poderia chorar e torturar-me mil e uma vezes que não teria ninguém para me enxugar as lágrimas, poderia ser feliz mil e uma vezes que de nada me valeria, poderia olhar-me ao espelho mil e uma vezes que nada mudaria, poderia dizer mil e uma vezes a mesma coisa que ninguém acreditaria, poderia ter mil e um leitores que ninguém me ligaria, poderia saltar mil e uma vezes mas nunca voaria, poderia gritar mil e uma vezes que ninguém me ouviria, poderia morrer e ressuscitar mil e uma vezes que ninguém repararia, poderia divagar mil e uma vezes mas não passaria da mesma coisa, poderia mudar mil e uma vezes mas continuaria a ter os mesmos defeitos, poderia ser tua mil e uma vezes mas nunca o serei, poderia derramar mil e uma lágrimas mas dor nunca sentirei, poderia (raios!) como poderia gritar com os Deuses mil e uma vezes para me tirarem este sufoco, esta raiva que está enclausurada!


Poderia, mas não o faço.

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